Poemas traduzidos de Emmie Rae

berlin

estava chovendo.

estava chovendo então nós penduramos nossos pulsos na varanda

eu disse “você tem fogo” num alemão terrível

todo mundo riu nervosamente até que alguém

me deu um isqueiro, molhado da chuva e então

nós assistimos ao futebol numa tv grande no quarto dele

sentados duros um do lado do outro bastante cuidadosos

de não nos tocar e a Itália ganhou, eu acho.

*

berlin.

it was raining.

it was raining so we hung our wrists over the balcony

i said “do you have fire” in terrible german

everyone giggled nervously until someone

handed me a lighter, wet from the rain and so

we watched the football on a large tv in his bedroom

sitting stiff next to each other acutely aware

of not touching and Italy won, I think.

*

Cidade de Nova York

mandei à sua casa uma foto dos meus peitos nus e

você foi como, merda isto é perigoso na internet

para seu bem eu estou deletando elas e quando eu

pedi um café gelado pequeno ele era duas vezes

o tamanho da minha cabeça e eu o abracei como um

namorado real ou um bebê porque parecia apropriado

considerando as circunstâncias, eu acho.

*

New York City

sent you home a picture of my naked chest and

you were like, shit is dangerous on the internet

for your sake I’m deleting that and when I

ordered a small iced coffee it was twice the

size of my head and I hugged it like a real

boyfriend or a baby which seemed appropriate

considering the circumstances I guess.

*

osaka

o hotel do amor será sempre alguma coisa.

qualquer roupa com que você me queira, peça,

eu mal me moverei. Eu passarei meus dedos na água da banheira

preguiçosamente me sentindo fodida e não tão excitada.

quando você for para o engradado de cervejas

pela sexta vez, você dirá algo sobre meus peitos

e como eles não preenchem este vestido que

você gosta tanto e você vai estar falando e você vai estar falando

e você vai estar falando ou alguma coisa.

*

osaka

the love hotel will always be something.

whatever costume you want me in, order it in,

ill barely move. I’ll dip my fingers in bath water

lazily feeling fucked and not that horny.

when you go to the plastic bag of beers

for the sixth time, you’ll say something about my

breasts and how they do not fill up that dress you

like and you’ll be talking and you’ll be talking

and you’ll be talking or something.

*

Dois micro poemas vagamente relacionados com minhas experiências sexuais que não sobre sexo

1.

Meu namorado está sorrindo para mim.

Eu quero dizer a ele ‘você parece psicótico’

eu quero dizer a ele ‘ eu acho que nós devemos terminar’

‘eu acho que nós devemos terminar porque você é um

usuário Windows, nossos valores estão em conflito’

eu estou sentada no banco do passageiro.

Nós paramos no sinal vermelho.

Meu namorado me olha e diz ” sobre o que

você está pensando?”

Eu digo ” Eu quero comprar uma camisa da Hello Kitty”

A luz fica verde.

2.

as vezes eu tento imaginar as garotas com quem você transou

nuas numa linha de identificação de suspeitos

há linhas de altura na parede atrás delas

elas estão segurando placas pretas com pequenas

letras brancas soletrando informações importantes

“Foi bastante ok”

“Eu fiquei ofendida, um pouco.’ ou

“orgasmos que me fizeram quem eu sou hoje”

Elas olham para mim e eu procuro por padrões entre elas

Eu decido que todas as garotas são bastante bonitas e

de olhar intenso.

Eu me sinto alienada.

Eu quero morder minhas unhas.

Uma garota está chorando.

Ela esta olhando para seus pelos pubianos e

chorando.

Sua placa diz

“me escolha”

*

1.

My boyfriend is grinning at me.

I want to say to him ‘you look psychotic’

I want to say to him ‘I think we should break up’

‘I think we should break up because you are a PC user, our values are conflicting’

I am sitting in the passenger seat.

We stop at a red light.

My boyfriend looks at me and says “what are you thinking about?”

I say “I want to buy a hello kitty t shirt.”

The light turns green.

2.

Sometimes I would try to picture every girl you have had sex with in a naked police line up.

There were height lines on the walls behind them

They were holding black cards with tiny white letters spelling out important information

‘It was okay’

‘I felt offended, slightly.’ or

‘Orgasms that made me who I am today.’

They stared at me and I looked for patterns between them

I decided all of the girls were very pretty and intense looking.

I felt alienated

I wanted to bite my nails.

One girl was blushing.

She was looking at her pubic hair, and blushing.

Her sign said

“Pick me.”

Compras Online

colheita de inverno é a jaqueta que vi online

eu quis comprar a jaqueta mas ela era muito

cara

eu estou pedindo para você respirar comigo na

floresta paludosa

com o celular cheio de sinal e múltiplos carregadores

solares

se eu te beijar então saiba que eu provavelmente significo isto

a maior parte do tempo

nós não temos ursos aqui, mas me mantenha a salvo

deles

me ensine a assistir pornografia e passe

seus dedos

através de mim e suas pernas nas minhas pernas

ok

*

Online Shopping

winter harvest is a jacket I saw online

i wanted to buy the jacket but it was very

expensive

i am asking you to breathe with me in the

wooden forest

with full phone reception and multiple solar

chargers

if I kiss you then know that I probably mean it

most of the time

we don’t have bears here, but keep me safe

from them

teach me to watch pornography and thread

your fingers

through mine and your legs through my legs

ok

emmierae_1348531397_17
Emmie Rae é uma escritora Australiana nascida em Sidney, é autora de We don’t have bears here, but keep me safe from them, do projeto Poetry will be made by all, e I’m going to lay on my back and breathe deeply. Infelizmente não consegui maiores informações ou precisar as anteriores sobre ela.

tentativa fragmentos e imersão 1

*

Isso é muito importante. Eu preciso que você preste atenção. Você pode me escutar? Vamos começar agora. Ao meu sinal abra os olhos devagar. Devagar, isso. Repare que o apartamento está vazio. Não há nada. Ainda me ouve bem? Tudo que se vê são as paredes, retas demais, cheia de tomadas, interruptores. Você já tinha reparado antes? Que tudo está vazio? O sofá esburacado não está mais aqui. Nem o tapete cheio de cinzas, nem a televisão doada, grande demais para a estante. Nada. Veja, dê uma volta. Os cômodos todos, brancos, ocos, as portas – repare nas portas – tristes, cansadas agora que não levam à lugar algum. Marcel? Você me escuta?  Me diga o que você vê?

– O braços dobrados de uma forma estranha. Um angulo impossível.

*

Bianca não responde quando pergunto se dormiu bem. Apenas prepara o sanduíche com a cara amarrada. Está assim há dois dias. Disse ontem que estava cansada. Ela está sempre cansada. Eu preciso me apressar. Já havia me atrasado duas vezes antes na semana. Bianca fica extremamente feia quando está brava. O que a torna uma mulher feia a maior parte do tempo. O cabelo dormido contrasta com a janela da cozinha.

– Você não está atrasado, Marcel?

*

O velho apartamento da Santos Dumont. Um monolito bege perdido ao lado do rio Tamanduateí. Depois que me mudei daqui que mudaram o Detran para cá. Na minha época não tinha esse movimento todo. Dezenas de motoboys apressados, pastas e capacetes na mão. Aqui o bar do Moacir, o homem mais gordo que eu já conheci. Hoje faz fortuna vendendo almoço. Aceita até cartão. Todo dia mais cedo eu descia aqui para tomar um café, o copo americano cheio daquele veneno. Todos os dias eu queimava os dedos e a língua. Talvez de propósito. Mas tinha lá sua beleza. Me sentir pequeno perto do trânsito empacado da avenida, o olhos ainda se acostumando ao dia. Acendendo o cigarro com dificuldade. Aceno com a cabeça, mas Moacir não me vê. Ou não me reconhece. Chego à frente do porta verde. Duas pessoas usam o degrau como banco do ponto de ônibus. Procuro em minha bolsa. Talvez eu ainda tenha a chave.

*

Marcel? Venha, ande comigo. Tudo bem, não há com o que se preocupar. Confie. Venha. Aqui, no corredor, veja, nem mesmo a marca retangular do espelho continua na parede. Foi você quem tirou o espelho daqui? No banheiro só a pia. E o cano do chuveiro. Gotejando. Espera, espera. Isso no chão? Não é areia? Não vai me dizer que esses outros são brincos? Pegue-os, Marcel. São os brincos da Mariana, não são? As corujinhas vesgas? Isso está ficando ótimo, não acha? Agora, isso é muito importante, eu quero que você corra até o quarto, rapidamente, talvez ainda dê tempo de devolve-los. O que me diz?

*

– Sente-se.

A nova sala de reunião da agência. Uma grande tv de led de 50 polegadas e uma grande mesa para umas 10 pessoas. No entanto, só Claudia está sentada, esperando que eu  também me sente. Os braços cruzados, nada sobre a mesa, nenhum papel, nada. É isso.

– Você está feliz aqui, Marcel?

– Estou sim, bastante.

– É o seguinte. Sou eu que está segurando você aqui. Pela Betina e pelo Victor você já estaria na rua. Você sabe que eu gosto do seu trabalho. Você escreve bem, Marcel.

– Obrigado.

– Mas a agência não te paga para escrever seus livros. Nem para dormir. Essa semana você chegou atrasado todos os dias.

– Tem uma obra na saída da marginal, aqui atrás.

– Então saia mais cedo. Olha. Eu vou ser bem sincera com você. O TI está monitorando seu notebook. É um pedido direto do Victor. Um relatório semanal. Pare de escrever poesias, pare de escrever seus textos.

– Uhum.

– Vim te dar um toque. Como quem gosta do seu trabalho. Mas você não tem a menor disciplina. Eu preciso te lembrar dos prazos todos os dias. Você não para de bocejar e se espreguiçar na cadeira. Marcel, tenho uma reunião com os sócios na sexta. Eu vou apresentar minha opinião sobre você. Você tem até lá para me mostrar que está disposto.

*

Apesar do frio eu caminho sozinho pela praia. Tudo é um universo branco demais, quebrado apenas pela areia mais escura.

– Já se passaram dez anos.  Você precisa esquecer isso.

Eu não respondo, sigo caminhando, me abraçando ao meu casaco.

– Marcel!. – Agora é Bianca. – De novo essa merda dessa cara, brother?

Eu não sei onde estou indo. Ou onde estou.

– Você acha que eu não sei no que você está pensando? Em QUEM você está pensando? Seu merda! Eu preciso de um homem, cara, não de uma criança, porra, eu também preciso de colo sabia?

Passo por ela. Sabendo que ela gritará mais alto.

– Eu não estou me sentindo bem, Bianca.

Duzentos metros mais a frente, algo largado na areia, uma carcaça talvez.

*

A chave entra e gira com alguma dificuldade. A grande porta verde de aço abre fazendo o mesmo barulho de dez anos atrás. A maneira como Mariana prendia os cabelos num coque alto. A destreza das mãos pequenas, como um oleiro que dá forma a um vaso, O olhar fixo enquanto a boca segurava o elástico. E todo dia antes que eu saísse ela me pedia que eu ficasse, que eu perdesse o emprego mas que eu voltasse para cama. E abria um espaço enquanto levantava o lençol. Subo no elevador.

– Mariana, eu não posso. Você sabe.

– É por causa daquela mal humorada com quem você se casou, não é?

– De quem? Claro que não. Do que você está falando? É só que eu preciso ir trabalhar, como todos os dias.

– Ah, corta essa. Deita aqui, depois você arranja outra mulher. Ou outro emprego.

Eu não tiro os sapatos. Ela me cobre e puxa meu braço.

– Ei, seu bobo, o que você anda fazendo Marcel? E seu livro? Você não me deu seu livro!

– Eu dediquei ele a você, sabia?

– Sabia.

– Não vendeu nem 50 exemplares.

– E você não escreve mais?

– Eu. Eu não consigo.

– Você sabe que isso é zica minha. Não sabe? – aqui pequenas risadas de ombros

– Zica, Mariana? Sua?

– É. Por você ter me matado.

Acho a chave do apartamento. Na porta ainda falta o número 4 do 41. Funciona.

*

Bianca sorri quando eu chego. Seus cabelos é que sorriem. Venha. Vamos beber um vinho. E novamente parece que tudo melhorou. De uma hora para outra. Ela já não estava mais brava comigo. Seu rosto voltara a parecer elástico. A última coisa que tinha me dito era que levaria as coisas dela pra casa da mãe. E agora, essa: Vinho.

– Um brinde. – Ela diz.

– Um brinde. – Nisso os armários começam a dançar.

– Marcel. Isso é muito importante. Eu preciso que você preste atenção.

Todos os dias eu queimava os dedos e a língua. Talvez de propósito.

– Você está me ouvindo? Marcel?

Eu quero que agora você corra até o quarto, rapidamente, talvez ainda dê tempo de devolve-los.

– Você me ouviu,caralho?

*

O quarto, Marcel, porque você ainda está parado na sala? Você precisa se apressar. Um vulto passa rápido pela porta do quarto. Passos duros e rápidos. Já está começando de novo! Que ótimo! Você sabe o que está acontecendo, não? Aqui a janela abrindo, emperrada, Marcel. Marcel! Ah, agora você corre, né? Um estalo seco. Aquelo grito novamente, aquela mulher apavorada.  O alvoroço. Não te deixam chegar perto outra vez? Que gente insensível! Vá até a janela. Ande, Marcel. Você precisa ver o que está acontecendo. Agora, vamos, olhe pela janela. Quem é você?

algumas traduções minhas em poemas de Ada Limón

Tubarões nos rios

nós diremos coisas inacreditáveis
um para o outro de manhã cedo-

nosso azul subindo de nossas raízes,
nossa água crescendo em nossos membros extraordinários

a noite toda eu sonhei com fogueiras e flamejantes lenhas
e fantasmas de homens, e espíritos
atrás daqueles pássaros ardentes

eu não posso dizer mais quando uma porta se abre ou se fecha
eu só posso ouvir o batente dizendo, Atravesse.

é um caminho pequeno –
para um outro quarto.

Considere a maçaneta. Considere a chave.

Eu digo a uma amiga, o quão medrosa eu sou com tubarões.

Como achei tê-los visto no rio
do outro lado da minha rua.

Uma vez esperei por eles, segurando um maço
de grama e ervas daninhas nas mãos
tremendo como uma menina de folhas fracas.

Ela me envia uma reportagem recente da National Geographic que diz

Tubarões mordem menos pessoas a cada ano do que
nova-iorquinos o fazem, de acordo com os registros do Ministério da saúde.

Então ela me leva ao meu caminho. Para a cidade dos tubarões.

Através de uma outra porta, eu ando ao East River dizendo

tubarões também são pessoas
tubarões também são pessoas
tubarões também são pessoas

eu escrevo todas as coisas que preciso na parte de baixo
do meu tênis. Eu digo, Vamos andar juntos.

O sol atrás de mim é como um fogo.
Pequeneninas chamas nas ondas do rio.

Eu digo algo pra deus, mas ele não é uma coisa viva
por isso eu digo isto ao rio, eu digo,

eu quero andar por essa entrada
mas sem todos aqueles fantasmas da margem
eu quero que eles fiquem aqui.
eu quero que eles sigam sem mim

eu quero que eles queimem na água.

*

Sharks in the Rivers

We’ll say unbelievable things
to each other in the early morning—

our blue coming up from our roots,
our water rising in our extraordinary limbs.

All night I dreamt of bonfires and burn piles
and ghosts of men, and spirits
behind those birds of flame.

I cannot tell anymore when a door opens or closes,
I can only hear the frame saying, Walk through.

It is a short walkway—
into another bedroom.

Consider the handle. Consider the key.

I say to a friend, how scared I am of sharks.

How I thought I saw them in the creek
across from my street.

I once watched for them, holding a bundle
of rattlesnake grass in my hand,
shaking like a weak-leaf girl.

She sends me an article from a recent National Geographic that says,

Sharks bite fewer people each year than
New Yorkers do, according to Health Department records.

Then she sends me on my way. Into the City of Sharks.

Through another doorway, I walk to the East River saying,

Sharks are people too.
Sharks are people too.
Sharks are people too.

I write all the things I need on the bottom
of my tennis shoes. I say, Let’s walk together.

The sun behind me is like a fire.
Tiny flames in the river’s ripples.

I say something to God, but he’s not a living thing,
so I say it to the river, I say,

I want to walk through this doorway
But without all those ghosts on the edge,
I want them to stay here.
I want them to go on without me.

I want them to burn in the water.

*

A condicional

Diga que o amanhã não vem.
Diga que a lua agora é uma geleira.
Diga que a amoeira está petrificada.
Diga que o sol é uma barricada de pneus queimando.
Diga que os olhos da coruja são alfinetadas.
Diga que o guaxinin é uma mancha de piche quente.
Diga que a saia é uma vala de lixos plásticos.
Diga que a cozinha é o cadáver das vacas.
Diga que nós nunca chegaremos a ver isto: brilhante
futuro, preso como uma estrela vagabunda, nunca
chegando perto, nunca deslumbrante.
Diga nós nunca a encontramos. Nunca a ela.
Diga nós gastamos nossos últimos momentos nos
encarando, mãos atadas juntas,
segurando o cachorro, vendo o céu queimar.
Diga , isto não importa, Diga, que isso seria
o bastante. Diga que você quer ainda isto: nós vivos,
bem aqui, sentindo-nos sortudos.

*

The Conditional

Say tomorrow doesn’t come.
Say the moon becomes an icy pit.
Say the sweet-gum tree is petrified.
Say the sun’s a foul black tire fire.
Say the owl’s eyes are pinpricks.
Say the raccoon’s a hot tar stain.
Say the shirt’s plastic ditch-litter.
Say the kitchen’s a cow’s corpse.
Say we never get to see it: bright
future, stuck like a bum star, never
coming close, never dazzling.
Say we never meet her. Never him.
Say we spend our last moments staring
at each other, hands knotted together,
clutching the dog, watching the sky burn.
Say, It doesn’t matter. Say, That would be
enough. Say you’d still want this: us alive,
right here, feeling lucky.

*

O primeiro

Rumo ao fundamento dos fundamentos,
a estrela funda no horizonte, o sopro inteiro
visão nas montanhas. Estes são os desenhos
da caverna, o começo das nossas preciosas
peças de autoestima, nossos braços segurando
nós mesmos, nossos braços feitos de papel,
nossos braços de papel segurando nossos órgãos
batendo dentro de nossos eu’s de papel.

*

The First

Down to the basics of the basics,
deep star on the horizon, full blown
vision in the mountains. These are the cave
drawings, the beginning of our precious
pieces of self worth, our arms holding
ourselves, our arms made of paper,
our paper arms holding our beating
organs inside our paper selves.

*

Esta Prática

Eles dizem a primeira coisa que se vai
é a memória a curto prazo. Você esquece
suas chaves, você esquece seu endereço,
você esquece o nome do presidente.
Eu gosto de pensar que é só uma questão de prática-
tivemos mais tempo para praticar a memória
da nossa luz favorita, do rosto do nosso irmão, o
riacho que passava pelo centro da nossa cidade.
Eu quero praticar. Como o soldado russo
que teve que inventar uma palavra pra dizer o quão
duro ele lutaria, ele disse que lutaria
“violentotalmente,” e é assim que vou me lembrar de você,
é assim como irei praticar – “violentotalmente.”

*

This Practice

They say the first thing that goes
is the short-term memory. You forget
your keys, you forget your address,
you forget the name of the president.
I like to think it’s just a matter of practice—
we’ve had more time to practice the memory
of our favorite light, our brother’s face, the
creek that runs down the center of our town.
I want to practice. Like the Russian soldier
who had to make up a word to say how
hard he would fight, said he would fight
“fiercefully,” that’s how I will remember you,
that’s how I will practice—“fiercefully.”

Sobre Ada Limón

ada

Ada Limón (28, deMarço de 1976) é autora de três livros de poesia: Lucky Wreck (Autumn House Press, 2006), vencedor do 2005 Autumn House Poetry Prize; This Big Fake World (Pearl Editions, 2006), e Sharks in the Rivers (Milkweed Editions, 2010). Seus poemas também já sairam na The New Yorker, The Harvard Preview, e Pleiades Journal. Ada já recebeu o prêmio Master of Fine Arts in Poetry da Universidade de Nova York onde estudou, além de ter sido agraciada com bolsas de estudo da New York Foundation for the Arts, da The Provincetown Fine Arts Work Center, e ter sido uma da juradas no 2013 National Book Award in Poetry.
Ela, atualmente, trabalha em um livro de ensaios, uma novela, e sua nova coleção de poemas, Bright Dead Things, que está sairá através da Milkweed Editions. Ada também trabalha como escrtirora freelance e professora de escrita criativa enquanto divide o tempo dela entre Lexington, Kentucky and Sonoma, California ( com uma grande quantidade de Nova York nos intervalos).

Bibliografia:

http://adalimon.com/about.html
http://www.poets.org/poetsorg/poet/ada-lim%C3%B3n
http://www.thescrambler.com/may07-limon.html

1

desrespeitemo-nos desde já não há tempo
para tango ou insossos coitos

lembro concordamos em destruir nossos corpos
um no outro – por favor
como fizeram com aqueles prédios
em que jamais trepamos
não há tempo por favor me arruíne
é pra isso que nos queremos
pra nos devolver, aos pedaços
aniquile o que for peito eu te imploro
sabemos não temos tempo não me deixe
meus lábios eu te imploro adeus

estudos líricos 1

“A poesia é a combinação de uma forma estudada e de uma emoção comunicada. Não há oposição entre forma e emoção: uma bela forma pode procurar uma emoção; uma forte emoção pode ser traduzida em uma forma perfeita.” (DANTZIG, 2008, p. 792)

DANTZIG, Charles. Dictionnaire égoïste de la littérature française. Paris : Librairie Générale Française, 2008.

você gostava de dizer dos helicópteros
que buscavam pólen no topo dos prédios
e estalava linda os lábios
em desaprovo
não, seu bobo
eles não vendem mais amor
na vinte e cinco de março

e insistia com olhos cerrados
de que sim havia gosto de café
em todos os postes do centro
e que as folhas de jornais
que voavam na barão de Itapetininga
contavam todos os segredos do mundo
conquanto claro você fosse um passarinho

até o dia em que você disse havia caminhos demais
no coração dos perdidos
e por isso a sensação constante
de que nos grita o chão pedindo pés

das memórias estes escombros
no canto dos olhos
seus os cabelos emaranhados
me perguntando
seu eu também claro era uma ruína
se eu também tinha pálpebras de aço
como um boteco
um domingo
ou um passado

nós nunca mesmo nos mudamos para aquele vagão imenso do metrô?

pouco antes que fossemos todos mortos
pelo capricho mais niilista
de deus, pelo
longo enterro de memórias ainda vivas
você me sussurrou
abrupta como quem jamais piscasse
que caso
nos tornássemos mesmo esquinas
seria fundamental aprendermos
a nos dobrar sozinhas

de morar esta distância
o contentar-se com o triz

e foram as mentiras
que carrego nos cabelos
dos dias
que quiseram por que quiseram lhe perdoar
pelos cataventos perdidos

e você disse sim me amava
quer era tolice
me amava
cedo demais
e por isso
é mesmo que nunca

você disse o que nos resta é este medo
esta entrega abrupta
que separa nosso peito demais, você disse

que não

você disse tudo bem
se apaixonar pelo meu sorriso
há esse vento mesmo
e só

Serão feitas três memórias e elas haverão de bastar
its a long way

dois rinocerontes enormes lutam no jardim
e toda quantidade faltante de sorte
hoje eu sou a janela
de maneira muito muito pequena
por que a gente se sente mesmo
como uma paisagem abrupta e estreita
quando te ligam as três da manhã
perguntando se são seus aqueles rinocerontes gigantes
no quintal
chove e toda quantidade de dúvida é um gosto de morte
e açúcar

no café

Fazer perder corpo

Deste beijo admita que me ama por maldade e deixe. O desespero precisa ser discreto, dedilhado: Que solto ar pairaria deste jeito não fosse teu hálito? Admita que o caminho se perdeu ao trilhar-se. E deixe. Que o sono tratará de embrulhar nossos sexos.
Deixe que eu me coloque aquém de mim, claro. Eu já te disse da úlcera. Tanto que aquela pessoa que não existe mas mora ainda em meu quarto quer agora me falar de aconchego. Veja. Os ponteiros do relógio da cozinha parece saíram pra jantar.
Não há como separar da triste cena nossas caras baças. E quando eu falar de fogo é, pois tenho pensado frio. Para comover, não para magoar. Quando eu falar de medo é tudo sobre esperança. Sabe bem, como quando digo de mim e é de ti que falo.
Eu dizia: há ainda este último medo que trago, pequena a chama bravia, e é só o que tenho.

Excerto de estilística IV

In O que é comunicação poética, Pignatari, Décio. 8.ed.-Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2005. pp18

Descobriu Jakobson que a linguagem apresenta e exerce função poética quando o eixo de similaridade se projeta sobre o eixo de contigüidade. Quando o paradigma se projeta sobre o sintagma. Em termos da semiótica de Peirce, podemos dizer que a função poética da linguagem se marca pela projeção do ícone sobre o símbolo — ou seja, pela projeção de códigos nãoverbais (musicais, visuais, gestuais, etc.) sobre o código verbal. Fazer poesia é transformar o símbolo (palavra) em ícone (figura).   

Excerto de estilística III

 

Beradinelli, Afonso. Da poesia à prosa. Trad. Dias, Maurício Santana. São Paulo : Cosac Naify, 2007. pp 67

 

“Mas o que busca, hoje, o público de literatura? As frustrações são cada vez menos dramáticas, os pesadelos, cada vez mais brandos. Curáveis. Há a televisão. As grandes religiões, especializadas na produção de remorsos,  sentimentos de culpa e sublimações, foram liquidadas. E a ideia de revolução, que pretendia ser a sua herdeira rebelde, mas legítima, é uma ideia que se tornou até risível. Produziu infinitos lutos e sacrifícios, antes de retornar como uma sombra no reino das sombras.”

Excerto de estilística II

 

CHKLOVSKI, Victor. A arte como procedimento. IN: TOLEDO, Dionísio de (org.). Teoria da literatura: Formalistas russos. Porto Alegre: Globo, 1973. pp 45

“E eis que para devolver a sensação de vida, para sentir os objetos, para provar que pedra é pedra, existe o que se chama arte. O objetivo da arte é dar a sensação do objeto como visão e não como reconhecimento; o procedimento da arte é o procedimento da singularização dos objetos e o procedimento que consiste em obscurecer a forma, aumentar a dificuldade e a duração da percepção. O ato de percepção em arte é um fim em si mesmo e deve ser prolongado; a arte é um meio de experimentar o devir do objeto, o que já é ‘passado’ não importa para arte.”

Excerto de estilística I

 

 

Baudelaire, C, “L’École païenne”” [1851], in Oeuvres complètes, v.II, org C. Pichois, Paris: Gallimard, 1976, pp. 48-49.

“O gosto imoderado da forma leva a desordens monstruosas e desconhecidas. […] A paixão frenética pela arte é um câncer que devora todo o resto; e, como a clara ausência do justo e do verdadeiro na arte equivale à própria ausência da arte, o homem se dissipa por inteiro; a especialização excessiva de uma faculdade conduz ao nada”.

Estudo de prosa I

A vi apenas vez. Evento infantil, plantio de muda em escola pública: Tinha franja moldurando sorriso que foi o que pegou. Risível, sei: Amour à première vue.  Atenciosa aos pequenos, correndo e rindo, nem ligava pra mão na terra. Vez apenas e pronto, logo ideário abstrato de casamento percorrendo aorta, viver pra sempre como se pra sempre fosse aquele agora, e eu nem pensei coisa dita, é comum: Palpitações costumeiras em peito arauto cobrando da cabeça jeito de pedir telefone.

Fiz piada com os vestidos coloridos das mães Fiz piada com a chuva que vinha-vindo e quando não veio mais, choveu. Nada de efeito, veio riso até, mas não de braço resvalado. Mudei o foco me engracei com os menores, me queria imagem paterna, pois era Freud quem iria me ajudar. Houve leves olhares sim, mas não o suficiente pra perguntar um arriscado quevaifazerhoje.

Pesquei nome e sobrenome nem sei onde. Redesocial serviria ao caso. A vi então vez mais. Agora, na tela, eu poderia arquivar sorriso, disco rígido é a nova caixa de sapato. Ver álbum? Foto de família, foto de lugar bonito, foto subaquática pra deixar cabelo brilhoso, óculos-escuros, repelente amiga presente viagem latinha latinhas e fogos. Ela curtia Miles e Pina. Até blog de poeminha tinha pra dar mais no nó. Adicionar como amigo? Lógico.

Olha que Sísifo teria pena de mim hein, rolling stone again: Foi me dito ali que eu não a conhecia. Que eu não poderia solicitar amizade, quem dirá então paixão. E que se não tomasse eu tento, logo que eu seria bloqueado, se insistisse em ser piegas assim ao máximo. Ainda mais depois de Pound.

Que, com outro, forma um par

Será preciso amor. E
mesmo havendo isso
que
não se vê, há de haver sandália, lençol, beijo
mas talvez ainda se faça necessário um milagre.
e isso
que
não se vê seja, de vez, nossa anistia, a dia lento

Mas quem de nós poderá negar
ser mesmo mais lindo
que
o que não se vê seja bocejo, preguiça, domingo
e assim enfim
a volta dos velhos inquilinos
aos seus sorrisos geminados.


Desvencilhar ligeiro entre velhos medos tristes e cansados

O curioso
é que quando acordo,
e acabo que acordo sempre,
me abordo de pronto
indiferente
desabrindo passados.

O curioso
é que quando sofro,
pois é verdade que sofro sempre,
me chego por dentro
discretamente
oferecendo cigarros.

O curioso
é que quando choro,
pois choro um pouco eternamente,
choro sorriso sem jeito
e quase sempre
me deixo,
a sós.